Sola dura
É, eita barro danado! Queimava a crosta fina da labuta
que em meu pé se formava. O que eu podia fazer?
Descalço, a vida era mais nua, escuta filho, não tem essa de meu bem-querer, não! Por quê? Eita trem desavisado, chega aqui, vou te dizer!
O tempo não amansa o barro da estrada da vida que em minha sola se petrifica.
Não acredita? Ô criança! O vento, esse sim é traiçoeiro,
joga na sua cara a poeira desgarrada, te fazendo engolir a seco aquela sua pisada fraca, mais arrastada. Te digo logo, sem pausada.
Se vai dar o primeiro passo nessa longa jornada, não vai de manso não,
senão vira risada no conto da caboclada que só espera o tropeção.
Vai firme, eita, criança!
O barro não mata e nem entorta, não adoece e nem afunda.
Amacia o pé dessa gente toda que rindo morre, com a sola dura
…
Poesias da vida dura
He, boiada!
O machado arrebenta a madeira
e na aldeia se faz sexta-feira
com a boiada correndo ligeira
nos cantões dos meus avôs.
Ehh! Que o tempo passa lesado
entre cantos e jongados
da gente outrora marcada
pelo medo de ser açoitada.
He, boiada! Carregando o novo
a esperança desse nosso povo
dos meus avôs sentados em toco
ensinando sobre a paz!
“Tombou o navio negreiro!”
Gritou o caboclo guerreiro
anunciando a paz a seus irmãos
meus avôs e avós de tantas gerações.
Viva a Liberdade!
Cantemos aos ensinamentos do cativeiro
sem pressa e sem medo – rio ligeiro!
Caboclos e Mulatos, Mestiços e Crioulos – Eis o nosso povo!
Rita Amaral (Rio de Janeiro, 1990). Historiadora, escrevendo versos e prosas ao vento.
Um comentário sobre ldquo;Neolatina: Mostra de poesia lusófona, por Rita Amaral”