Azul saturno
O corte
A palavra sangra
Pois é viva
Por baixo e por dentro
A voz
A voz
A voz
Diz
À frente, apenas o grande passado
É possível
Recolhido sob a forma de um planeta
Audível longínquo
Orbitando o sol frio e azul
De um antigo sistema morto
Onde quintais vários
Marcam o ritmo de um ciclo
Que nunca mais!
Olha o Saturno digerindo o mar!
Olha o Sol expelido por trás!
Eu ontem era um
Hoje sou tantos e tantas
Que nunca mais!
A sorte nos trouxe, amor
Uma sombra nova
Densa feito nuvem de tempestade
Eletrificada como o clarão que dela deriva.
À deriva, olho o susto
Com o qual meus ouvidos
Ouvem o espanto do meu corpo
Em estar à deriva na clara substância
Que deriva da sombra e da sorte da sombra.
A tempestade cai desvairadamente
Sobre as cinco casas que me habitam
E meu pensamento pensa:
De repente é deus atormentado
Por ter sido inventado
E estar enjoado do seu próprio destino.
De repente é a má consciência
Recaindo feroz sobre a neve
De uma nova consciência por se criar.
De repente é o repente do tempo
Relâmpago azul no horizonte
Saltando o abismo sem fim.
De repente é o fluxo em refluxo
De um oceano possível e passivo
Revertendo, enfim, as direções
Pelas quais navegamos, inertes.
O corte.
Palavra sangra
Pois é viva.
Viva!
Evandro Alves Maciel (São Paulo, 1980). Poeta, graduando Filosofia pela Faculdade de São Bento, de São Paulo e fotógrafo amador. É autor do livro de poemas “Veneno de Ornitorrinco” (Ed. Patuá, 2016).
Um comentário sobre ldquo;Dossiê de Literatura Neolatina: Mostra de poesia lusófona, por Evandro Alves Maciel”