Artista visual e curadora de artes da Revista Philos, a artista mineira, Anna Luiza Magalhães conversou com o editor chefe da Philos, Souza Pereira, sobre o seu processo criativo. A ilustradora da Philos número 2 do projeto Philos Reposter, conta que a sua a liberta e afirma:
é necessário suprir a fome de conhecimento e experiências para estimular o que há de mais instigante dentro do nosso peito.
Sem mais delongas, leia a entrevista da artista para a Philos:
Quem é Anna Luiza Magalhães?
Eu sou uma pessoa curiosa. Me dizem que sou criativa, e eu digo que, na verdade, sou uma pessoa que gosta de ouvir. Percebi que gosto de misturar as experiências. Por formação, me graduei em Design de Moda e também em Artes Visuais, com habilitação em Pintura e Gravura em Metal. Sempre gostei de dançar e, apesar de nunca ter feito profissionalmente, sempre me deixei remexer o corpo. Sou apaixonada com música, do erudito ao popular, por qualquer forma de expressar em som. Brinco de batucar, descobri essa paixão através do maracatu, que me ensinou a me expressar com o corpo e som. Hoje tenho meu próprio estúdio de Design, onde transformo com pesquisa e amor a minha arte em soluções criativas para empresas e pessoas. Minha arte é não ter padrão, regra ou espaço definido. Onde houver oportunidade, busco minha expressão.
Nos intriga a poética dos artistas, as influências, os livros que nunca deixam de ler, podias nos dizer quem são suas luzes poéticas?
Acredito que a inspiração ou luzes poéticas, como disseram muito bem, venham de caminhos diversos e muitas vezes inesperados. Somos todos nós seres humanos e, portanto, de alguma forma sensíveis ao mundo a nossa volta. Eu acredito que as nossas luzes venham disso. Eu me alimento da arte através da dança, música, do olhar para um outro trabalho visual, de um trecho de livro que li. A minha arte vem do meu respirar: de uma pessoa que observei na rua distante em pensamento, de uma conversa que tive, de um filme que vi, de uma vivência pessoal e individual. O nosso íntimo tem muito a dizer e ele tem uma voz universal, os nossos medos e ansiedades, que escondemos na convivência, surgem na arte como monstros que são, muitas vezes, onde as pessoas se reconhecem.
Qual o papel das artes?
Pergunta difícil. Não sei te dizer qual o papel delas ou se é que possuem de fato algum. A arte já foi utilizada para comunicar, para embelezar, para ensinar, para refletir, demonstrar, e, em todas essas, expressar, mas isso talvez seja apenas o prato raso dela. A arte é o profundo da alma, é onde não encontramos razão, mas de alguma forma aquilo nos significa alguma coisa e isso pode ser talvez uma falta completa de sentido ao mesmo tempo. A arte é a incoerência, é a resposta, é a busca incessante por um motivo e que concretiza seu prazer na emoção.
Não há um só autor que não nutra o seu trabalho em algum referencial das artes plásticas: pinturas, exposições, filmes… Porque é necessário nutrir-se das artes plásticas no processo criativo?
Nutrir de outras artes estimula o olho e o corpo a mover. Nutrição é uma boa palavra para isso, é como se fosse alimento. É necessário suprir a fome de conhecimento e experiências para estimular o que há de mais instigante dentro do nosso peito. Imagino um tambor tocado em conjunto a outros tambores, numa Nação de cultura popular. Esse tambor vibra, arrasta no chão e bate dentro do nosso corpo. Nesse momento, o corpo não consegue ficar no mesmo lugar. Alimentar-se de arte é sobre se mover do lugar.
O que você pensa das editoras independentes?
Eu admiro trabalhos independentes. A criação autoral muitas vezes se vê impedida de ser difundida por causa de fundos e patrocínios. Os criadores independentes são aqueles que erguem as mangas e fazem na própria mão a sua história. Com todo aquele suor triplicado. mas com toda a riqueza e propriedade de espalhar, por aí, material de qualidade.
Como você percebe o Brasil diante da literatura e das artes?
O Brasil é um país imenso. Tive o privilégio de morar em três, das cinco, regiões. Acabei vivendo uma mistura cultural, o que me fez perceber a nossa amplitude e diversidade. A nossa bagunça de costumes, nos torna ainda mais ricos e autênticos. Tenho enorme orgulho de ter em nosso portfólio brasileiro, um Manoel de Barros, Guimarães Rosa e uma Adélia Prado, que fazem nossos regionalismos e intimidades, serem o reflexo de um povo simples, cheio de cultura e sensibilidade.
O que sua arte faz pelo outro e para si mesmo?
A minha arte hoje me liberta. Mas é uma liberdade estranha, porque ela me torna refém dela mesma. Eu comecei a entender o que eu queria com a arte quando parei de me boicotar. A arte não é sobre ter regras. É sobre sentir, deixar viver, doer, sofrer, renascer, recriar, reinventar. É isso que quero que a minha arte faça pelo outro: o faça compreender que o medo não é motivo de esconder e que a ferida é uma cicatriz que fortalece a alma. É um bem comum a todos.
O que é necessário ler hoje em dia?
Ler as pessoas. Cada um é um livro repleto de vivências que justificam seus caminhos. Para interpretar é preciso permitir conhecer cada livro pessoa, com suas riquezas individuais. Cada marca do rosto diz, escondido, o que cada olho viveu.
Existe uma diferença substancial entre um criador e uma pessoa que não o é?
Todos somos criadores. O ser humano é criativo por natureza. O que talvez exista seja uma sensibilidade estimulada a mais em um para uma coisa e em outro para outra coisa.
Muitos criadores não sabem a que se deve a sua capacidade de criar. De onde vem o seu desejo artístico?
Meu desejo vem de muito o que já disse nas perguntas anteriores. As histórias das pessoas me interessam muito, gosto de saber ou então imaginar as razões e cicatrizes de cada uma. Como se as pessoas fossem casas velhas e a pele delas guardassem experiências como as paredes guardam momentos. Mas acho que essa minha curiosidade vem como reflexo da minha vontade de entender e vivenciar intensamente os meus devaneios.
Os leitores desfrutam da relação entre o texto e as ilustrações. O que te dá a certeza de que aquela identidade visual é própria para aquela arte e vice-versa?
A ilustração muitas vezes ajuda a estimular o universo imaginativo que a leitura trás em palavras. Eu acho que ilustrar não é entregar a forma e sim, provocá-la.
Qual o seu maior pecado artístico?
Produzir menos que gostaria.
Qual a obra ou autor que despertou em você o desejo de ser artista?
Os que me despertam hoje, principalmente, são: Frida Kahlo, Francis Bacon, Kate Kowitz e Lucian Freud. Mas, de mais nova, que me deu muito estímulo a começar a pintar, foi o Claude Monet, sem dúvida. A música me estimula muito a criar, gosto de sons instrumentais e de música popular.
O que não cabe em uma pintura?
Nada. Melhor, não cabem regras.
O que é indispensável para a sua vida?
Sentir.
Que pergunta você faria aos nossos leitores?
Se eles já se permitiram descobrir sua intensidade como indivíduo.
| Sobre a artista |
Anna Luiza Magalhães (Minas Gerais, Brasil). Artista Visual, formada pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, com habilitação em Pintura e Gravura em Metal, com formação complementar no Instituto Politécnico de Bragança, em Portugal, no curso de Animação e Produção Artística, e também Designer de Moda, pela Universidade FUMEC. Pós-graduada em Gestão de Design para MPE’s na Escola de Design da UEMG. Integrante do Coletivo Carimbo desde agosto de 2012, desenvolvendo projetos e exposições de Artes Visuais e também fundadora e Diretora Criativa do Estúdio Biscoito Maria, estúdio de comunicação e design em Belo Horizonte. Participou de exposições conjuntas em Belo Horizonte, Congonhas, Itaúna, Nova Lima e Sete Lagoas, dando destaque para a exposição “O imaginário compatilhado” na Galeria BDMG Cultural, além de algumas exposições individuais em Belo Horizonte e em Bragança, Portugal.
| Colaborações na Philos |
Philos Reposter #2: Anna Luiza Magalhães foi a responsável pela capa da segunda edição da Revista Philos lançada como parte do projeto Philos Reposter.
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