em tempos de redes sociais, luz ribeiro prefere pousar em redes de balanços e afetos, em seu perfil no instagram tem alguns seguidores, mas luz sonha em ter sempre com quem seguir. luz é coletiva: slam das minas-sp e coletivo legítima defesa. escreve desde que fora alfabetizada e nem por isso se acha poeta, sonha com o dia em que será poesia. luz é campeã do “flupp bndes” (2015), campeã do “slam br” (2016) e semi-finalista da “coupe du monde de slam de poésie“, que ocorreu na frança em 2017. na televisão, protagonizou um dos capítulos da série “bravos” na tv brasil. é autora dos livros: “eterno contínuo” (2013), “espanca” e “estanca” (2017). raiou no verão de 88 em são paulo, gosta de escrever com letrinha minúscula, nasceu antes de aquário pra presa não ficar. luz é: mar-mãe de ben e filha-mar de odoyá. e no suplemento cultural da philos 20/20 de primavera-verão, a philos conversa com a artista. eis aqui um drops da entrevista:
luz, durante esse ano curatorial, a philos se debruça sobre temáticas que circundam os corpos insurgentes. entender a nossa dimensionalidade física é também reconhecer-se no espaço, nas vivências múltiplas como ser social e principalmente reflexionar sobre o papel (e impacto) dos nossos corpos nesses lugares. como você vê o seu corpo?
vejo meu corpo, ainda buscando reparação de mais de 400 anos de escravização dos corpos que antecederam o meu corpo. vejo meu corpo, não cabendo nas numerações dos manequins. vejo meu corpo, ainda valendo menos. vejo as falas que saem da minha boca, não sendo valoradas por terem saído do corpo que saíram, corpo este, o meu. esse não ver do meu corpo que a sociedade insiste em replicar, faz com que eu me veja mais, e veja todes que são plurais na mesma invisibilidade, e uma vez vistos, não mais invisibilizades. eu vejo meu corpo um corpo de memórias, tecnologias e saberes ancestrais. eu vejo muito do todo que só compete a alguns verem.
e quais as lutas que o atravessam?
eu mulher, preta, periférica, mãe, bissexual, conjugo luta em cada marcador aqui posto. cada indivídue a sua maneira sabe qual seu maior atravessamento. eu sou uma mulher preta, uma pessoa periférica preta, uma mãe preta, uma pessoa bissexual preta. dentro de todas as minhas experiências, em qualquer luta que eu esteja a raça se coloca em conjunto. assim como gritaram para victoria santa cruz, também “gritaram-me negra”, antes mesmo, que eu me reconhecesse em qualquer outra coisa. apontarem-me negra, e isso me causou inúmeros danos. entender-me negra, me salvou de muitos deles.
são muitas questões a serem debatidas a partir da sua obra: uma literatura que está interessada em questionar um leitor, instaurar um momento de reflexão das palavras… de onde vem o gesto da sua escrita?
“eu sou o sonho e as esperanças dos escravos” maya angelou disse, assim acredito que meu gosto pela escrita com toda certeza veio de um sonho inconsciente de alguma ancestral escravizada. operando no campo da consciência, minha inclinação pelas palavras surge ao ver minha mãe que pouco domina a escrita orquestrar palavras e registrar seu tempo. escrevo na primeira pessoa do singular, para me conectar com tudo que for plural durante o caminho. escrevo para registrar esse tempo, recontar o que por nós não foi dito e garantir a todes que sucumbirem o plano em curso de genocídio, nascerem e conseguirem se manter vives, possam criar as próprias narrativas. escrevo para preencher as lacunas na trajetória da minha avó e garantir acúmulos na história do meu filho. escrevo sonhando que a linguagem não seja barreira entre diásporas [e não é]. escrevo porque um dia disseram que eu não podia, e o que tudo não podia a gente foi lá e fez. vê?