Há algo errado
Há algo errado,
Descentralizaram os grandes centros para becos sem saída
Onde os muros altos falam por nós
Por si.
Há algo errado,
São seus brasões que causam atrito sobre o solo de concreto,
E que o vetam com as suas marchas magnificentes e justas que gritam
E gritam
Preces.
Todas, todas tementes à arrogância umas das outras
E a nada mais.
Preces temerárias que perseguem a integridade umas das outras.
Há algo errado,
Quem sabe exista algo de verdadeiro que possa ser ofertado a um deus envergonhado como prêmio de consolação à essa existência tardia?
Há algo errado,
Heráldicos olham a olho nu corpos queimados nus
E gozam,
E em seguida,
Cospem uns nos outros
Numa espécie de ofensiva de redenção.
Há algo errado,
Continuará sendo fácil mudar o mundo enquanto houver esperança,
Desde que esperança permaneça
A mesma
E não deixe que matem a grande rainha
Memória.
Há algo errado,
A memória é a única que fará parte do arrebatamento
Porque nós não somos capazes de lidar com os nossos próprios erros,
Nem de consertá-los,
E nós não queremos perdão,
Queremos mais razão para deter o avanço de sentimento.
Há algo errado,
A fome liberta as misérias humanas e ainda causa estranhamento.
Há algo errado,
Não existem extremos a serem alcançados.
Tudo não passa de uma grande cadeia fechada de falhas cíclicas
Que se auto flagelam e a tudo que se aproxima,
Tornando tudo inalcançável.
Há algo errado,
A morte não passa de destino,
E a perda de memória também.
Há algo certo,
Rirão da esperança,
‘’Ela não fazia nada direito’’
Chorarão pela morte da memória,
‘’Ela foi o resto de humanidade que nos sobrou mesmo que evitássemos consultá-la nos momentos mais urgentes’’
Marcharão, erguendo o outro brasão,
A cabeça,
E a sua definitiva certeza:
Há algo errado, mas
Vencemos.
Leticia Canedo (São Paulo, 1996). Escreve como forma de protesto contra si mesma.
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