I
cabe em um poema
o acolhimento do absurdo
crises crinas metais pesados
cristais
em um poema cabe
a celebração da forte chuva
entender que água lava
entender que ela inunda
em um poema
certamente
cabe a dúvida
II
não me conformo com o sistema simplório
de certos planos de expressão
diante de materialidades pouco magnificas
ambiciono a desordem da inteligível escrita
quero entender o risco de edificar rabisco
pra quem lambe líquens e linguagens
uai, eu me interesso mais pelo pêlo da poesia
que pela palavra literariedade
III
não se pode matar
a escrita que carrega em seus ombros
a história que se quer morta
mata-se o homem dificilmente a fome
mata-se a memória
a poesia sobrevive à hora
Mariana de Matos (Minas Gerais, 1987). Poeta e artista visual. Autora de Para acabar com as obras primas ou sobretudo o verso [poesia, UEMG, 2009), Prosa e verbo/verso [poesia, edição da autora, 2010), Meu corpo é um esconderijo (poesia, editora Penalux, 2014), META (poesia, editora Bendito ofício, 2016) e Poesia pra pixo (poesia, editora Bendito ofício, 2017). Fundou o selo de poesia Bendito ofício. Desenvolve há 7 anos o projeto Poesia como paisagem.
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