Neolatina v.6 nº36 (2019)

¿Achi m’ek tä amel lawen tä iyej tañhi? Essa pergunta escrita em língua originária wichí foi feita por uma criança da Província de Formosa, na Argentina, e significa “Como vocês veem a floresta hoje?”.

A primeira edição histórica da Philos do ano V se dedica à luta em torno das prerrogativas legais das comunidades tradicionais das Américas. Luta esta que deverá se intensificar a partir de agora no Congresso Nacional brasileiro, tendo em vista que no último dia 4 de abril de 2019 foi lançada a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, que terá um total de 248 parlamentares, sendo 219 deputados e 29 senadores.

A Frente Mista terá um papel-chave na defesa e proteção dos direitos dos povos indígenas por meio do aprimoramento das leis e da atuação firme para impedir retrocessos anunciados pelo atual governo, criando uma força parlamentar à altura da importância política, simbólica e histórica que essa agenda representa para o país. Entre as ações da Frente Mista, a expansão do conhecimento indígena, da oralidade e da literatura desses povos é tida como fundamental para salvaguardar seu patrimônio cultural.

Educação, território, cultura e literatura dos povos originários são os temas que norteiam as discussões da Philos #36, aproximando os nossos leitores dos saberes tradicionais, identidade e memória, das vivências e anseios dos povos originários na atualidade.

Ao longo da produção desse editorial acompanhamos alguns debates com a primeira indígena eleita para o Congresso Nacional, a deputada Joenia Wapichana (REDE/RR), enquanto ela ainda apresentava o seu primeiro Projeto de Lei que torna hediondo os crimes ambientais. Por viverem em contato íntimo com a terra, os povos originários têm a consciência de que não são seus senhores, mas parte dela. Para eles essa ligação é espiritual, mas também carnal, como diz Ailton Krenak: “Quando nós falamos da terra, falamos do planeta como organismo vivo. Nós somos filhos desse organismo vivo”.

Em seu discurso histórico na Assembleia Nacional Constituinte, em 4 de setembro de 1987, Ailton Krenak lembrou que o modo de vida dos povos originários nunca pôs em risco “a existência sequer dos animais que vivem ao redor das áreas indígenas, quanto mais de outros seres humanos”. Há três anos o povo Krenak, da região de Mariana, perdeu o “Watu”, como chamavam o Rio Doce, e morreu um pouco junto com ele. Joênia faz parte da geração seguinte a dele – que lutou, principalmente, para que os direitos dos povos indígenas fossem reconhecidos pela Constituição de 1988. A briga hoje é para que essas vitórias se consolidem, mas os novos tempos impuseram outros desafios. E estes ultrapassam, em muito, as fronteiras das terras indígenas.

Neolatina #36

Desde o ano de 2018 a Philos participa do projeto “Oralidade escrita” em parceria com a SEGIB – Secretaria Geral Ibero-Americana, que fomenta a transcrição de histórias narradas por crianças indígenas da América Latina. A cultura oral foi registrada pelos próprios jovens das comunidades nativas de línguas qom, pilagá e wichí, da Argentina e Colômbia. Não foi feito nenhum tipo de recorte de gênero literário, pois acreditamos que as classificações são modos impostos pela academia e que não configuram um fator importante para a valorização e expansão de uma cultura.

Apesar disso, compilamos os textos em duas seções de nosso editorial, pois entendemos que as sociedades ocidentais e a academia, em geral, não aceitam produções que não representem seus “métodos”; a função dessa categorização em nosso editorial se deu para que nossa comunidade de leitores possa assim legitimar o “lugar de fala” dos adolescentes nativos que produziram tais relatos.

Desejamos uma ótima leitura.


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Neolatina v.6 nº36 (2019)

¿Achi m’ek tä amel lawen tä iyej tañhi? Essa pergunta escrita em língua originária wichí foi feita por uma criança da Província de Formosa, na Argentina, e significa “Como vocês veem a floresta hoje?”.

A primeira edição histórica da Philos do ano V se dedica à luta em torno das prerrogativas legais das comunidades tradicionais das Américas. Luta esta que deverá se intensificar a partir de agora no Congresso Nacional brasileiro, tendo em vista que no último dia 4 de abril de 2019 foi lançada a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, que terá um total de 248 parlamentares, sendo 219 deputados e 29 senadores.

A Frente Mista terá um papel-chave na defesa e proteção dos direitos dos povos indígenas por meio do aprimoramento das leis e da atuação firme para impedir retrocessos anunciados pelo atual governo, criando uma força parlamentar à altura da importância política, simbólica e histórica que essa agenda representa para o país. Entre as ações da Frente Mista, a expansão do conhecimento indígena, da oralidade e da literatura desses povos é tida como fundamental para salvaguardar seu patrimônio cultural.

Educação, território, cultura e literatura dos povos originários são os temas que norteiam as discussões da Philos #36, aproximando os nossos leitores dos saberes tradicionais, identidade e memória, das vivências e anseios dos povos originários na atualidade.

Ao longo da produção desse editorial acompanhamos alguns debates com a primeira indígena eleita para o Congresso Nacional, a deputada Joenia Wapichana (REDE/RR), enquanto ela ainda apresentava o seu primeiro Projeto de Lei que torna hediondo os crimes ambientais. Por viverem em contato íntimo com a terra, os povos originários têm a consciência de que não são seus senhores, mas parte dela. Para eles essa ligação é espiritual, mas também carnal, como diz Ailton Krenak: “Quando nós falamos da terra, falamos do planeta como organismo vivo. Nós somos filhos desse organismo vivo”.

Em seu discurso histórico na Assembleia Nacional Constituinte, em 4 de setembro de 1987, Ailton Krenak lembrou que o modo de vida dos povos originários nunca pôs em risco “a existência sequer dos animais que vivem ao redor das áreas indígenas, quanto mais de outros seres humanos”. Há três anos o povo Krenak, da região de Mariana, perdeu o “Watu”, como chamavam o Rio Doce, e morreu um pouco junto com ele. Joênia faz parte da geração seguinte a dele – que lutou, principalmente, para que os direitos dos povos indígenas fossem reconhecidos pela Constituição de 1988. A briga hoje é para que essas vitórias se consolidem, mas os novos tempos impuseram outros desafios. E estes ultrapassam, em muito, as fronteiras das terras indígenas.

Neolatina #36

Desde o ano de 2018 a Philos participa do projeto “Oralidade escrita” em parceria com a SEGIB – Secretaria Geral Ibero-Americana, que fomenta a transcrição de histórias narradas por crianças indígenas da América Latina. A cultura oral foi registrada pelos próprios jovens das comunidades nativas de línguas qom, pilagá e wichí, da Argentina e Colômbia. Não foi feito nenhum tipo de recorte de gênero literário, pois acreditamos que as classificações são modos impostos pela academia e que não configuram um fator importante para a valorização e expansão de uma cultura.

Apesar disso, compilamos os textos em duas seções de nosso editorial, pois entendemos que as sociedades ocidentais e a academia, em geral, não aceitam produções que não representem seus “métodos”; a função dessa categorização em nosso editorial se deu para que nossa comunidade de leitores possa assim legitimar o “lugar de fala” dos adolescentes nativos que produziram tais relatos.

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