Era tarde da noite e a chuva castigava o campo lá fora. Sem nenhuma piedade, trovões cortavam o céu e incendiavam árvores secas. O cenário era horrível em qualquer direção que se olhasse.
Em uma velha casa por ali, morava um senhor de idade, Ferdinand. Calejado pela vida, esquecido pelos filhos, e amargurado pela morte da esposa, ele vivia sozinho em um antigo edifício de madeira caindo aos pedaços. Goteiras encharcavam a casa por todo canto.
Sentando-se em sua velha poltrona, abandonado pelo sono, ligou a televisão e tentou sintonizar algum canal. Sem sucesso. A chuva causava interferência na transmissão já ruim pela distância da cidade.
Levantou-se, então, de seu assento, e caminhou até a velha estante que tentava preencher o vazio da enorme sala de estar e de sua amarga existência. Vasculhando as gavetas à procura de alguma coisa para se distrair, encontrou algo que não desejava: uma velha fotografia em que se encontravam quatro pessoas: ao centro, ele e a falecida esposa se abraçavam e sorriam felizes para o fotógrafo. À direita do casal, a filha mais velha, Sophie, com 15 anos na época, e, à esquerda, o filho mais novo, Louis, com 09 anos.
Sem perceber, havia caminhado de volta à poltrona. Os olhos cheios de lágrimas observavam, atentamente, a fotografia. Virou-a e leu as doces palavras escritas pela esposa na parte de trás, uma inscrição quase apagada pelo tempo que dizia:
“A paixão que surgiu em nós será eterna. Como a fênix que renasce das cinzas, o nosso amor viverá para sempre.”
Lendo aquilo, sentiu um aperto no coração e se lembrou da esposa, Maggie, dizendo-lhe aquelas meigas palavras. Palavras essas que foram imortalizadas naquele pedaço de papel.
Levantou-se novamente da poltrona, chorando a dor da saudade. Quase sem forças, tomado pela emoção, conseguiu chegar ao quarto e encontrou a cama arrumada. Já não dormia há algumas noites. Retirou o travesseiro e acomodou a fotografia debaixo dele. Deitou-se na cama e se cobriu; afinal, a chuva ainda castigava a casa. Por um tempo, permaneceu acordado, ouvindo-a cair no telhado. Enfim, adormeceu, para nunca mais acordar.


Vitor Martins (Ourinhos, São Paulo, 1998). Viu na arte de escrever uma saída para os dramas e problemas enfrentados no cotidiano. Sonhador e determinado, busca espaço no mundo literário.

Publicado por:Philos

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