Poeira cósmica
Eu não havia percebido a quantidade de células que o meu corpo perdeu.
Os fios de cabelo e as unhas que já fizeram parte de mim, mas que se desprenderam.
Sendo abandonado pelas menores partículas que vão sendo substituídas,
Sinto a fogueira interna iluminar a perda do que já foi essencial ao meu corpo.
A destruição das moléculas que criaram seres complexos e improváveis da vida.
Assim como vieram e compuseram, partiram e deixaram a máquina humana ainda funcionando.
Desligando-se e adquirindo o direito de não existir, ainda perdida no espaço em outra forma.
O instante que sobreviveu e que teve o seu tempo para começar e o seu para acabar.
O retrato do que aguarda a todos e a leve lembrança do que aconteceu.
O encontro do passado com o presente, apontando a futura certeza determinada.
E isso reanima as sensações que passaram, mas que estruturaram sem deixar perceber.
E permaneço na agonia de perceber que o tempo passava e eu não estava percebendo.
O acúmulo de coisas que não eu pensava reunir e perder sem perceber.
Todo um estresse não planejado que recebi mesmo sem pedir ou sem acreditar precisar.
A vida oferecendo coisas sem utilidade, que, juntas, podem continuar a não fazer sentido.
Tudo aquilo que de dúvidas e de incertezas é acumulado e que nunca será solucionado.
Tudo está se acabando, tudo está virando poeira.
Tudo o que foi importante morrerá ou adormecerá para sempre.
A surpresa de lembrar que tudo vai se deteriorando, virando novos sedimentos esquecidos.
O espanto de ser surpreendido pelo que sempre esteve aqui perto.
Rene Bezerra (Fortaleza, 1996). Estudante de Administração e escritor amador, que escreve para libertar o próprio pensamento.
Um comentário sobre ldquo;Neolatina: Mostra de poesia lusófona, por Rene Bezerra”