A exposição “O novo e o sobrevivente. O caso Raphael Galvez” – uma realização Arte132 Galeria e Instituto Luciano Momesso – entrou em cartaz no último dia 25 de novembro, traçando os caminhos percorridos pelo artista entre as décadas de 1940 e 1990, ao estabelecer diálogos entre os movimentos moderno e contemporâneo. A mostra , idealizada por Orandi Momesso e Telmo Porto, conta com textos críticos de Tadeu Chiarelli e Mayra Laudanna, pesquisadora autora do livro Raphael Galvez 1907-1998, da Momesso Edições de Arte.

Raphael Gálvez (2023)

A seleção de obras proporciona uma observação profunda, questionando o mito do progresso ininterrupto em sua pintura, ao mesmo tempo em que enfatiza a relevância dos elementos que compõem o vocabulário formal de Raphael Galvez. Neste, é possível identificar elementos que remetem tanto à prática estabelecida, como à crescente tendência não figurativa que ganhava força no Brasil naquela época. O artista não apenas se posiciona entre esses dois espectros opostos da construção pictórica, mas também os coloca em diálogo direto.

Raphael Gálvez (2023)
Raphael Gálvez (2023)

A pintura de Raphael perpassa diversas fases e revisita o passado e o presente, como uma ânsia de apreender o leque de referências que colecionava. A década inicial, em 1940, é de frutífera produção entorno da paisagem urbana paulista ainda em formação e é notável o saber construtivo italiano que Galvez adere neste período, com tons baixos e cores soturnas.

Já na década de 1950, as transformações no circuito da arte brasileira, com as criações do Museu de Arte de São Paulo (MASP), o Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP) e a primeira Bienal de São Paulo em 1951, desencadearam uma revolução nas produções até então figurativas de Galvez. As possibilidades do não figurativo contaminam seu olhar ao ponto de fazê-lo abraçar os desafios formais de seu tempo o que marca uma inflexão em sua produção. Para Chiarelli:

“A visitação a acervos de todos os lugares e períodos, pessoalmente ou via consulta ao próprio banco de imagens, permitirá a Galvez engendrar um vocabulário formal e iconográfico repleto de soluções que, quando se levam em consideração suas paisagens de início de carreira, pareceriam impensáveis.”

Ainda segundo Chiarelli:

“sua produção, em algumas ocasiões, assumirá um vocabulário radicalmente não figurativo, mesmo preservando em cada uma dessas pinturas elementos presumivelmente autorais, sobreviventes a todas as transformações surgidas com os novos desafios que a arte do seu tempo lhe provoca”.

Raphael Galvez (2023)
Raphael Galvez (2023)

Raphael Galvez passou grande parte da sua vida dividido entre as pinturas, desenhos e esculturas que realizava por puro prazer, e as esculturas tumulares e projetos para monumentos, que lhe rendiam o sustento próprio e de seus irmãos. Acolhido pelo Grupo Santa Helena, associação de artistas fundada em 1934, Galvez foi parceiro de ateliê de Mário Zanini. O pintor construiu sua obra a partir dessa experiência, que o levou a aplicar-se em intermináveis sessões de modelo vivo e a observar com curiosidade as variadas manifestações artísticas realizadas pela cidade. Em meados dos anos 1950, seu trabalho foi integrado a duas mostras panorâmicas: 50 anos de paisagem brasileira, apresentada no Museu de Arte Moderna por Sérgio Milliet, e Exposição do Retrato Moderno, montada no Parque Ibirapuera. Neste momento, suas obras foram exibidas junto não apenas às do Santa Helena, mas às dos modernistas – o que marca um inequívoco reconhecimento de seu trabalho pelo circuito e pela crítica. 

A partir da década de 1960, Galvez passa a viver em prolongado recolhimento, com exceção para depoimentos sobre seus contemporâneos e participação em mostras dedicadas aos anos de 1940. O artista ganhou uma série de exposições próprias retrospectivas. A mais extensa delas, que contou com a curadoria da historiadora Vera D’Horta, ocorreu em 1999, no ano seguinte ao de sua morte, na Pinacoteca do Estado de São Paulo.

Raphael Gálvez (2023)
Raphael Gálvez (2023)

Tadeu Chiarelli é professor sênior ECA USP. Dirigiu o Museu de Arte Moderna de São Paulo, o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo e Pinacoteca de São Paulo. Formado em Artes Visuais pela ECA, Chiarelli participou de aulas de Walter Zanini durante sua graduação. Seu orientador na dissertação de mestrado foi Teixeira Coelho, cujo tema foram as críticas de Monteiro Lobato à arte modernista no Brasil. Sua tese de doutoramento centrou-se na atuação de Mário de Andrade como crítico de arte sob orientação de Annateresa Fabris. Entre 1996 e 2000 foi curador-chefe do Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo, Chiarelli atuou neste museu tanto em cargos administrativos quanto curatoriais. Entre 2010 e 2014, foi Diretor do Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP. De 2015 a 2017, também foi diretor da Pinacoteca do Estado de São Paulo. Entre 2007 a 2010, foi chefe do Departamento de Artes Plásticas da ECA. Coordenou o Centro de Estudos Arte&Fotografia (2004) e o Grupo de Estudos em Crítica de Arte e Curadoria (2005-2013), ambos no Departamento de Artes Plásticas da ECA-USP.

Raphael Gálvez (2023)
Raphael Gálvez (2023)

Mayra Laudanna é professora aposentada do Instituto de Estudos Brasileiros-USP e autora, entre outros livros, de La dialectique Maria Bonomi.

Raphael Gálvez (2023)
Raphael Gálvez (2023)

Fundada em 2021, por Telmo Porto, o compromisso da Galeria Arte132 é o de alargar as fronteiras da História da Arte Brasileira, através do diálogo crítico e fundamentado sobre personagens e obras que merecem o devido reconhecimento. Atuante nas artes, Telmo tinha também vocação para a educação e a Arte132 é a junção desses dois universos. Nas suas palavras, “pretendemos reincluir nomes no cenário das galerias e instituições, sempre com orientação curatorial e escolhas motivadas, revisando narrativas históricas ou produções atualmente pouco presentes no mercado de arte”. Dessa forma, a Arte132 nasce com o propósito de reaproximar o público de artistas do final do século 19 e início do século 20, mas não só. Ao longo de sua trajetória, a Galeria vem promovendo exposições embasadas em pesquisas cuidadosamente elaboradas, além de fomentar a arte contemporânea com mostras que trazem à luz artistas relevantes, cumprindo, assim, com a sua diretriz de ser um ponto de conexão entre os vários tempos.

Raphael Galvez (2023)
Raphael Galvez (2023)

Serviço: “O novo e o sobrevivente. O caso Raphael Galvez”, na Arte132 GaleriaAvenida Juriti, 132, Moema, São Paulo – SP. Em exposição até o dia 17 de fevereiro de 2024. Entrada gratuita. arte132.com.br 

Raphael Galvez (2023)
Raphael Galvez (2023)

Descubra mais sobre Philos

Assine para receber os posts mais recentes por e-mail.

Publicado por:Philos

A revista das latinidades

O que você achou dessa leitura?