uma puta história

A Daspu foi criada em 2005 pela prostituta Gabriela Leite, com apoio de diversas trabalhadoras sexuais e ativistas para dar visibilidade e sustentabilidade ao movimento das prostitutas e às ações da organização Davida, fundada na década de 1990. O nome Daspu foi proposto com humor para ironizar a Daslu, grife de luxo paulistana que, àquela altura, enfrentava problemas na justiça, diante das acusações de contrabando e fraude.

Gabriela Leite foi uma das fundadores e precursoras do Movimento Brasileiro de Prostitutas no Brasil e na América Latina, participou ativamente da construção do SUS – Sistema Único de Saúde e da Organização Davida – que hoje chama-se Coletivo Puta Davida, em sua homenagem. Gabriela sempre defendeu o uso afirmativo e político da palavra puta.

Diante da repercussão gerada pela sua proposição, a grife Daspu acabou se tornando um dispositivo artístico-cultural que dialoga com as questões relacionadas a prostituição, estigma, orgulho e liberdade de expressão no embate contra as normas sexuais e de gênero, movimentando uma puta passarela de lutas feministas e LGBTQIAPNB+. Nos seus 17 anos de existência e trabalho, a Daspu atraiu para as passarelas inúmeras putas, mulheres cis e trans, pessoas não-binárias, mulheres lésbicas, homens trans e outras identidades de gênero dissidentes, pessoas racializadas com suas lutas e reivindicações.

uma puta palavra

O estigma da “PUTA” atravessa todas as mulheres, identidades de gênero e sexualidades. —Qual mulher nunca teve medo de ser chamada de puta? “Filho da Puta”, “Puta que Pariu”, “Puta Merda”. Não são poucos os usos pejorativos do termo que viraram os xingamentos mais populares não só da nossa, como de diversas línguas e que são direcionados para agredir mulheres. Para Gabriela Leite:

Comecei a pensar nisso por conta das minhas filhas mesmo. Por conta das filhas das minhas colegas também (sic). Eu ficava preocupada porque que minhas filhas eram filhas da puta, isto é, o maior palavrão mais horrível da sociedade – isso é horrível! Então a gente tem que mudar, “filha da puta” deve ser um nome de orgulho pras filhas da gente. E também acho que se a gente não toma as palavra pelo chifre e assume elas, a gente não muda nada.

uma puta parada

“Daspu é uma puta parada e uma parada de puta”, é o que diz o hino da Daspu, que questiona e engaja as lutas das putas mulheres e pessoas dissidentes e dá protagonismo ao movimento das putas por meio de suas próprias  putas-perspectivas. Seja na linguagem da moda ou da performance, dialogando e ocupando espaços públicos e privados com objetivo de provocar e fomentar o debate sobre todas essas questões, ainda tão importantes no enfrentamento das violências de gênero e suas intersecções com as políticas do corpo.

A arte é uma estratégia de combate ao preconceito e ao estigma de uma sociedade perante a comunidade de trabalhadoras sexuais. Pensando nisso, a Daspu organiza nesta sexta-feira, 17 de março de 2023, o evento Puta Amada Brasil!, às 21h no Bar Dellas, na Gamboa, Rio de Janeiro. O evento serve para reafirmar as lutas políticas das prostitutas, para deliberar acerca da complexidade de suas vidas, de seu trabalho, de suas escolhas sexuais e reprodutivas. O projeto também segue em campanha na Benfeitoria – Puta Amada Brasil: Daspu Novu Brasil!

O desfile coreografado contará com 12 putamodels e apresentação da artista Deize Tigrona, da poeta e pesquisadora Rainha do Verso, da Slam das Minas Rio e da prostituta putativista, Betânia Santos. Além do som da puta-DJ Patricinha Mentirozzza e convidades.

No evento serão apresentadas as novas artes e produtos sustentáveis desenvolvidos pelas putativistas: o “Putopinho”, top feito com tecidos reutilizados que se transforma em saia, vestido e bandeira de arte; e o “Putangolé”, que será apresentado pela primeira vez na passarela. Todos os trabalhos foram desenvolvidos por trabalhadoras sexuais e profissionais de moda, arte, cinema e fotografia em oficinas de trocas de saberes, com apoio do Fundo Elas.

A performance das artistas contará ainda com a apresentação de uma nova versão da Bandeira do Brasil, nomeada Puta Manto, estilizada com uma esfera celeste em vermelho e a inscrição “Indígenes, Negres, Pobres e Putas”, e a nova Puta Manta transnacional, que será apresentada no desfile com as cores da bandeira trans. Ao ressignificar símbolos e expressões, a Daspu, valoriza as putativistas como artistas, diretoras, realizadoras e protagonistas não somente de suas histórias, como de sua marca de importância social. Representando-as como cidadãos brasileiras, putas amadas que são, sem estigmas.

Publicado por:Philos

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