A poesia contemporânea em línguas originárias do México & Centro-América

com curadoria de Martín Tonalmeyotl e traduções de Sabrina Graciano

Irma Pineda, Yan Lucila Lema, Esteban Ríos Cruz, Manuel Espinosa Sainos, Humberto Ak’abal, Inti Cartuche Vacacela, María Concepción Batista, Martín Tonalmeyotl, Hubert Matiúwàa, Isaac Esau Carrillo Can y(e) Nádia López Garcia

A poesia escrita em línguas originárias do México & Centro-América nasce no século XX com assessoria de estudiosos como Carlos Montemayor e Miguel León-Portilla, para mencionar apenas alguns. Eles encorajaram os falantes de línguas originárias das Américas a criarem suas próprias obras. No entanto, o trabalho destes homens e mulheres não foi suficiente para dar voz a estas línguas que foram objeto de maus-tratos por parte dos colonizadores e das instituições governamentais durante séculos e séculos de exotização e que se arrastam até os dias de hoje. O trabalho dos primeiros escritores indígenas não foi só escrever e publicar obras em diferentes línguas, mas a maior tarefa foi abrir espaços para o reconhecimento, a difusão e a alfabetização que serviu para toda uma geração de poetas do século XXI e que está fortalecendo a diversidade linguística latinoamericana, contribuindo para um maior entendimento da nossa literatura originária. Montemayor, em uma de suas notas sobre a literatura em línguas originárias mexicanas, menciona como é importante que os escritores possam opinar desde um eu pessoal com os recursos e as características estilísticas de uma língua e um pensamento próprios. Assinalando: Com estes escritores temos a possibilidade, pela primeira vez, de nos aproximar, através de seus próprios protagonistas, do rosto natural e íntimo, do profundo rosto de um México que ainda desconhecemos.

Registro de Eduardo Viveiros de Castro

Foi até meados do século XX que os zapotecos do Istmo de Tehuantepec consolidaram-se como a primeira geração de escritores em língua originárias [e talvez seja deste mesmo período os primeiros artistas destes povos que começaram a escrever sua poesia aos moldes ocidentais]. Antes deles não se podia analisar nem o artista nem a obra porque simplesmente não existiam obras em línguas originárias escritas nas Américas ou, se existiam, eram passadas pela tradição oral. Atualmente existem materiais impressos e digitais suficientes nos quais se pode dar a conhecer estas literaturas e escritas.

Nos motiva como editorial independente, juntamente com nossos curadores e editores, dar a conhecer as palavras e os pensamentos de poetas indígenas no projeto Pássaros Azuis cantem minha Memória. Projeto este que está sendo lançado ano após ano pela nossa revista em parceria com o curador Martín Tonalmeyotl e os editores do Círculo de Poesía, do México. Os poetas aqui apresentados compartilham alguns poemas inéditos de suas obras e são eles seus próprios tradutores ao espanhol. Colabora conosco, nas traduções ao português, a pesquisadora Sabrina Graciano, que nos apoia neste projeto desde 2018. Na lista de idiomas participantes neste projeto aparecem mais de 10 línguas ameríndias, algumas delas em risco de completo apagamento, como: o náhuatl, kichua, binnizá, ñuu savi, totonaco, tsotsil, maya e zapoteco. Eis os autores:

Irma Pineda, Yan Lucila Lema, Esteban Ríos Cruz, Manuel Espinosa Sainos, Humberto Ak’abal, Inti Cartuche Vacacela, María Concepción Batista, Martín Tonalmeyotl, Hubert Matiúwàa, Isaac Esau Carrillo Can y(e) Nádia López Garcia

Cada língua representa um povo e cada povo tem sua própria forma de manifestar a palavra desde a poesia, a filosofia, a medicina, entre outras áreas, onde a palavra é semente e fruto ao mesmo tempo. Por isso será comum no decorrer deste especial, o aparecimento de um dicionário especial de subjetividades e poéticas para as traduções. Existem ainda mais de 6700 línguas originárias no mundo, das quais o 40% correm o risco de desaparecer devido à falta de políticas linguísticas [e de falantes] que protejam estas línguas. No México [país com maior número de falantes em línguas originárias das Américas], a situação linguística é semelhante: De 69 idiomas falados em todo o território, 32 deles correm um alto risco de se perderem. E incluem todos os idiomas já incluídos nesse projeto, quanto: o ahuacateco, ayapaneco, teko, oluteco, pápago, ixcateco, kiliwa, paipai, cucapá, kumiai, pima, matlatzinca e tlahuica.

Registro de Eduardo Viveiros de Castro

Pássaros Azuis cantem minha Memória —a poesia contemporânea em línguas originárias da Centro-América nasce a partir das séries Xochitlajtoli e Brasiliana/Guaraní idealizadas pelo curador Martín Tonalmeyotl para a Philos e Círculo de Poesía; em que se publicam escritores de diferentes línguas originárias das Américas Central, do Norte e do Sul. Todos os participantes desta série são homens e mulheres voluntários, alguns de reconhecida trajetória, e outros muito jovens que estão propondo novas temáticas e quebrando os estigmas sobre a poesia indígena na contemporaneidade. O especial é o único no âmbito da poesia indígena das Américas, continente que reúne os melhores expoentes da cultura e da palavra [poética e estética] ameríndia.

Registro de Eduardo Viveiros de Castro

E por falar em línguas, a análise da palavra Xochitlajtoli está composta por duas raízes morfológicas da língua náhuatl [na tradução, língua clara ou asteca]: xochitl ‘flor’ e tlajtoli ‘palavra’. Miguel León-Portilla, um dos maiores estudiosos do náhuatl, traduziu a palavra poesia como in xochitl, in cuicatl, que significa: ‘a flor, o canto’ ou ‘flor e canto’. Foi uma expressão usada antes da ocupação espanhola —que não só incluiu a poesia como gênero literário, mas também o pensamento nahua em toda sua extensão. Nas diferentes culturas que existem no México a poesia é definida de diferentes formas: palavra flor, palavra nuvem, palavra vida, palavra chuva ou bem como o descreve o poeta mè’phàà Hubert Matiúwàa:

No idioma mè’phàà, a poesia é nomeada de muitas maneiras, as definições dependem do contexto da palavra e ‘de quem a faz sua’; por exemplo, ajngáa xka’tsá [palavra que alegra], ajngáa dxáwua [palavra que aconselha ou palavra das estrelas], anjgáa xawíí [palavra que acorda], anjgáa tsi’yaa [palavra bela], ajngáa yáá [palavra mel], ajngáa tsíama [palavra que veio do tempo]. Não existe o conceito que abarque tudo, cada palavra em sua diferença faz o todo e cada uma delas tem sua própria estrutura poética de acordo com seu uso e seu existir na língua de cada um.

Registro de Eduardo Viveiros de Castro


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Publicado por:Philos

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